terça-feira, 28 de agosto de 2012

No princípio: A verdadeira história de Adão e Eva


Era seu último dia de trabalho, véspera do feriado eterno que ele mesmo se presenteara. Deus já tinha feito o cosmos, a lua, as estrelas, a terra e o mar. Também tinha feito os bichos, as moscas, as bactérias e até o ornitorrinco. Mas ele sentia falto de algo mais. Deus sentia que suas ferias teriam muita contemplação da natureza, muito lirismo lindo, tudo azul. Deus, safo como era, viu que podia ser muito chato passar a eternidade apenas observando aquele imenso mundo, como se a vida fosse uma eterna exibição de documentários naturalistas do Animal Planet. Deus sentia falta de um drama, uma novelinha básica das oito, um melodrama. Foi tentando conversar com um macaco peludo que Deus teve a idéia: bem que esse macaquinho podia falar, né? Deus riu de sua própria piada. Imagina uma macaco falante, rsrs.. Mas ousado como era Deus decidiu correr o risco e ver no que ia dar. Foi assim que surgiu Adão. E Eva. Mal sabia Deus o destino que lhe esperava.
Sim! Adão e Eva surgiram juntos, ao mesmo tempo. Fazia uns dias já, desde logo após as amebas, que Deus inventara os animais em dupla. E inventara o sexo. Deus gostou da ideia e adotou o sexo como padrão a partir dali. Pois, convenhamos: ver um sexo animal era bem mais divertido do que ver bolinhas moles se dividindo sozinhas!
Mas a criação de Adão e Eva logo virou um problema. Esta certo que eles falavam, mas falavam o tempo todo. E eram meio chatos, repetitivos. Adão entrou numas de contemplação Riponga e saiu saltitante pelo campo maravilhado com as belezas da criação. As vezes voltava com uma flor na mão, uma minhoca sua nova melhor amiga, um celular conectado no face book.. Tudo para Adão era divino. Deus ficou até meio preocupado com essa toda essa animação saltitante e chegou a pensar: filho meu tem que ser macho!”. Mas tolerante como era logo desistiu de ações repressivas com seu saltitante macaco falante.
Com Eva era pior. Ela vivia reclamando da decoração: “Que papo é esse da água ser incolor inodora e insípida? Odeio coisa insipida, que horror..”. “E aquela sacada lá? “, disse Eva apontando ao monte Everest. “Não dá para fazer mais baixa não? A vista é boa, mas só maluco para subir lá”. E a pior, a queixa que deus realmente magoou: “Mas afinal..Quem é o decorador dessa joça?”. Era tanta reclamação que Deus sentiu pela primeira vez o peso de ser homem. Homem casado. Tanto que, na outra vez que veio a terra bilhões de anos depois, Deus optou por ser solteiro. Mas isso é outra história.
O fato é que era véspera do feriado eterno e Deus tinha pouco tempo para consertar aquela coisa toda. Ele começara a ver que, com Eva reclamando como louca, a vida no paraíso seria um inferno. Eva queria tanta atenção que nem contemplar os animaizinhos tranquilo Deus podia mais. Para Deus, que já já iria partir dali, o Paraíso seria um péssimo canal televisivo para ele sintonizar nas ferias eternas que ele tanto planejara. Todo seu esforço de 6 dias seria em vão. E Deus pela primeira vez na vida eterna chegou a pensar: dessa vez fui longe demais!
Foi então que Deus decidiu radicalizar. Quando Eva falou da decoração ele ficou tão furioso que pensou: e se eu desse consciência para essa mulher?”. Era uma idéia maluca, nunca nenhum outro Deus no mundo fez isso e o próprio Deus logo se censurou. E entrou num longo monologo interior: Afinal , seria muito cruel dar consciência a um serzinho tão insignificante quando Eva. Imagina ela sabendo que existe morte? Não coitada, não ia aguentar. Tá certo que consciência também tem umas coisas legais, admito. Mas ela não merece. Ou merece? O que é que tem ter mais gente consciente além de mim? Não será egoísmo meu ser o único consciente em todo o cosmos? Isso pegou para Deus. Espiritualizado como era Deus praticava o desapego de seu ego e achou que seria justo compartilhar com alguém. E continuou: Mas será que eles suportam?”. Foi bem nessa hora que Eva parou na frente de Deus e começou a criticar sua barba.. “Muito grande essa barbicha, hem? Está na hora de dar uma aparada. Com essa autoimagem e com esse portfolio horrível que você chama de Paraíso não vai conseguir mais trabalho de decorador”, disse ela, irônica como uma cobra. “E depois vai vir aqui, pedir ajuda para mamãe”. Foi a gota dágua. Novamente furioso Deus concluiu que pior do que esta não fica e que essa Eva merecia a consciência. Merecia nos dois sentidos, o bom de ter merecimento, e o ruim de “essa muié merece”.
Foi assim que ele decidiu dar a Eva a maçã do conhecimento. Na verdade mesmo não tinha maça alguma, era só dar o conhecimento. O problema é que ela devia querer o conhecimento e, apegada a estética como Eva era, ela não daria bola para um conhecimento muito abstrato. Ele precisava de uma bela fruta para simbolizar a beleza do conhecimento.
Além disso, Deus, safo como sempre foi, já tinha percebido que seu prestigio andava baixo e que sua egocêntrica criação não dava muita bola para ele. Por isso, não adiantaria ele dar uma de Deusão gostosão e, todo bonitão, oferecer solenemente a maça a Eva. Ela ia ignorá-lo.
Foi assim que Deus inventou a pegadinha do malandro. Sim, pois a historia da maça foi basicamente uma pegadinha. Deus queria que Eva comesse a maça para ter conhecimento mas não sabia como convence-la disso. Olhando o comportamento dela concluiu: se eu disser que é proibido ela vai querer! Foi nessa hora que Deus inventou o pegadinha. E, ao mesmo tempo, inventou o pecado!
Ah... O pecado! A ideia do pecado foi realmente uma das ideias mais geniais que Deus já teve. Só empata com a ideia da mulher mesmo. Só um grande dramaturgo como ele poderia pensar nisso. Afinal, a ideia de pecado não faz o menor sentido do ponto de vista divino. Se tudo aquilo era criação dele e ele era onisciente, onipotente e onipresente porque raios algum macaco falante poderia fazer algo que seria errado? Estava tudo sempre certo, uai. É obvio. O problema, deus logo percebeu, é que isso de estar tudo sempre certo era chato demais. Tal como um gatinho que brinca com acuado no canto antes de mata-lo o legal era o homem acreditar que podia desafiar a Deus. Pois aí é que dava jogo. Não que Deus fizesse questão de matar o homem, nem mataria. Mas se o homem soubesse desde o inicio que já estava tudo certo ele não participaria do jogo. E deus queria o jogo, pois o jogo é que era divertido!! Foi assim que Deus inventou o Pecado, o “isso não pode” e, de tabela, a culpa e o drama. E o mais engraçado foi que Eva acreditou. Foi assim que começou a história e o teatro, com Deus fazendo seu primeiro papel, uma espécie de apresentador de programa de auditório, com Eva, Adão e a Serpente falante como personagens do reality show!
A cena vocês já conhecem: Deus chegou todo formal e fez um discurso solene sobre as benfeitorias do Paraiso. Parecia político. Eva que ainda não sabia da existência de políticos ignorou e achou que aquilo era papo de decorador. Mas ao final Deus soltou sua verdadeira arma secreta, seu maior gancho dramático, o seu famoso: “Não pode”!!!! Deus disse: “Tudo isso é para vocês, mas tem algo que não pode!” Eva já olhou interessada. E Deus concluiu misterioso: “Não pode comer a maça! Não pode comer a maça!”. Não deu outra, Eva caiu com um patinho. Ficou louca de vontade de desafiar aquele decorador metido, queria porque queria fazer um pecado básico, ver qual era a onda daquele tal de conhecimento. Deus via tudo do alto e vibrava: agora esse filme vai ficar bom! Para dar mais emoção Deus deu voz a uma serpente venenosa que atuava como o Alexandre Frota no Casa dos Artistas, incitando Eva ao pecado. Ela caiu rapidinho e para a alegria de Deus a história começou. O grande finale todos conhecem e teve uma magnifica atuação de Deus como pai ofendido! Genial. Eva caiu como um patinho.
Já o Adão, perdido no inicio, mas Maria- vai-com-as-outras desde sempre, logo entrou na parada. Para Adão, Deus lançara outra maldição: ficar tarado por Eva. Deus se livrava assim daquela boiolagem inicial do Adão riponga e botava o homem para trabalhar. Não deu outra, ao comer a maça Adão passou os dias a querer seduzir Eva para ver se alcança a transcendência perdida. Para seduzir Eva ele começou a entrar numa de construir cabanas, castelos, pirâmides e outros brinquedinhos que exibiam poder. Para conseguir construir tudo isso ele começou a brigar com os outros Adãos e o filme foi ficando cada vez mais divertido. Para Deus isso tudo foi ótimo. Primeiro porque Eva, ocupada com os pecados da maça e contemplada em seu ego pela atenção de Adão, parou de reclamar tanto. Só reclama as Evas que não querer comer a maça, mas aí é cada-um-cada-um. E os Adãos viraram divertidos personagens da farsa cômica que eles chamam de disputa do poder. Deus, sempre que cansa de contemplar os bichinhos malucos, coloca na novela das oito e vê os Adãos naquele jogo maluco cheio de Evas sedutoras.
Claro que a história tem muitas outras variações e o jogo de Deus com o homem é bem mais complexo que isso e continuará nos próximos capítulos, mas essa parte é a verdadeira história de Adão e Eva. E é o início da história.
Para que o jogo ficasse mais divertido Deus, que é muito mais criativo que os criadores de games, inventou a não-ação. Cada jogador tem sempre a possibilidade de não-agir por um tempo e não será morto por isso. Ao contrário, isso pode fortalecê-lo. Se o jogador-homem começar a ter muita ânsia de fazer pontos vai explodir de gordo ou bater o carro no poste.
Mas não que seja fácil a não-ação. É um dos testes mais difíceis do game da vida humana. Para dificultar a não–ação Deus criou as necessidades materiais e deixou o homem com um pedaço do cérebro límbico que fica facilmente viciado em suas próprias necessidades. Isso é super legal, pois aumenta a responsabilidade do homem jogador. Ele é que tem que decidir a cada instante. Se por um lado ele tem dramas reais e precisa pagar as contas e dar uma trepada para acalmar o seu límbico interior, por outro ele pode viciar nisso e virar um doidinho que é levado a morte pela ânsia de fazer mais pontos no game da matéria.

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